Mário mora na Zona Leste e trabalha em uma obra de metrô na Zona Oeste. Precisa chegar cedo ao emprego, então acorda às 4h30 da madrugada. Levanta, se arruma, dá um beijo na esposa ainda dormindo, olha o quarto das crianças e rumo ao trabalho.
Pega um desses ônibus velhos (aqueles que, para “dar o sinal” para descer, ainda se puxa a cordinha) lotado de trabalhadores como ele. Muitos ainda com sono, afinal, está escuro. Os que estão sentados tentam dormir, mesmo com as ruas muito esburacadas. Algumas pessoas encostam nas janelas e batem a cabeça a cada virada um pouco mais brusca; outros tentam se manter acordados olhando para o nada e observando o ônibus ficar cada vez mais cheio. Uns chegam a dormir em pé, tamanho cansaço.
Mário está acostumado com essa rotina. Não gosta do ônibus lotado, nem do metrô cheio de gente, mas precisa do dinheiro para alimentar sua família. Sua esposa, Celeste, é doméstica em “casa de família” como se diz popularmente, e ganha um pouco mais de um salário mínimo. Mário também não ganha muito, mas consegue comprar ainda um presentinho para as crianças.
Chegando ao metrô da linha vermelha, toma uma “média” em uma das padarias ao redor. Enquanto olha a televisão sintonizada naquela emissora mais famosa, conversa com o padeiro sobre o tempo, o trânsito, esses assuntos mundanos.
Rumo ao metrô, junto a milhares de transeuntes e trabalhadores, como ele. Quase nunca tem um espaço vago para sentar-se, muito menos nos bancos cinza, que deveriam estar destinados a idosos, grávidas, mulheres com crianças de colo e deficientes físicos. Mas geralmente estão ocupados por estudantes ou senhoras que nem precisam estar sentadas ali, mas estão.
No trabalho, quase nada de conversa; levanta viga, abaixa cimento, leva janelas, escorrega vidros, limpa o rosto suado, Sol no rosto e na nuca, pensa nos filhos. Cantarola um pagode, lava sacos, carrega peso ainda com o Sol a pino, leva cimento, abaixa viga, concreto e fiação. Constrói o concreto mais valorizado da cidade e recebe pouco. Aos poucos, Mário e seus companheiros vão levantando a estrutura da linha amarela, mas ninguém saberá disso.
Na volta para casa, mais trânsito, ônibus e metrôs lotados de pessoas que, como ele, estão cansados e suados, apenas querendo chegar em casa e descansar, depois de um longo dia. Apesar de todo empurra-empurra e aperto, Mário ainda sorri. Sorri, pois sabe que consegue prover sustento e dignidade aos seus filhos. Sorri, pois ignora os “problemas da gente lá de Brasília”.Sorri, pois tem consciência de que faz bem.
Mário pensa em como sua mulher e filhos ficarão orgulhosos do pai quando ver a estação pronta. Assim como muitos edifícios e construções importantes da cidade, mais esta foi feita com o trabalho quase escravo e quase forçado de trabalhadores como Mário.
Bom dia do trabalho sem trabalhar!
Bianca escreve às terças e ainda tenta descobrir o que leva milhares de pessoas a conviverem na mesma cidade lotada de gente. O Mário (que Mário?) não existe, personagem ficcional, ok?