domingo, 13 de maio de 2007

119 anos depois

(colaboração forçada de Luiza Delamare e Giselle Godoi, que também mantêm um blog e, nas horas vagas, estudam e praticam jornalismo)

É lá no centro de São Paulo que estão as roupas, os acessórios, os eletrônicos e o mais que o vil metal contado do trabalhador puder comprar por preços acessíveis, mais baixos, maravilhosos, inacreditáveis. É lá que se vai antes das seis, antes do rapa, com a bolsa colada ao corpo e dinheiro suficiente para fazer a festa e as compras do ano. É lá que está a pirataria e o resultado de trabalho árduo. Árduo, às vezes, até demais.

Os bairros do Bom Retiro, Brás, Belém, Vila Maria, Mooca e Pari abrigam um sem número de confecções clandestinas, a maioria de propriedade de coreanos, a maioria mantida por bolivianos, peruanos e paraguaios. E por lá, quase sempre, os hermanos se amontoam em condições precárias, insalubres, sub-humanas e escravistas.

Os migrantes dos países vizinhos chegam aqui com esperanças de melhores condições de vida. Chegam aqui e encontram dificuldades para regularizar sua situação. Sem documentos, sem português, sem saber o que fazer, acabam se submetendo a trabalhar 17, 18 horas por dia por menos de um salário mínimo nacional. E não se consideram escravos.

Em 2003, o Governo Federal, por meio da Comissão Especial do Conselho de Defesa
dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), elaborou o Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo. As ações são voltadas, principalmente, ao combate à escravidão no campo. E até que tem dado consideravelmente certo.

A apresentação do texto elaborado pela CDDPH para o plano afirma: “No Brasil, a escravidão contemporânea manifesta-se na clandestinidade e é marcada pelo autoritarismo, corrupção, segregação social, racismo, clientelismo e desrespeito aos direitos humanos”.

Aqui na paulicéia, a escravidão tem um certo caráter etnicista - o migrante explora seu conterrâneo. E se ele não fizer, outro faz. E, afinal, é preciso sobreviver nessa vida de deusmeu. Acaba que hoje, em São Paulo, existem cerca de 200 mil bolivianos; e só 80 mil legalizados. Os outros estão por aí, chamando nossa atenção por serem “um povo costureiro”, e quase nada mais.

A polícia não pode agir nessas confecções a não ser que haja denúncia. E a denúncia normalmente não vem. Porque somos um povo livre que corre para não perder o emprego. Livre para olhar para o lado e para o relógio. E, presos ao tempo, nos livramos por tabela da culpa de não sermos livres.

Aline queria escrever nesse domingo sobre escravidão, já que foi em 13 de maio que a heroína Isabel salvou os negros brasileiros dessa labuta forçada. Ela queria ter feito uma matéria como se deve, mas só foi “avisada” hoje sobre o aniversário da Lei Áurea e não teve como encontrar as fontes. E promete que vai se adiantar da próxima vez.