quinta-feira, 17 de maio de 2007

Ocupação da Reitoria da USP - Pra não falar que não falei em flores.


Um macarrão para vegetarianos, outro “normal”. Cada um serve seu pratinho de plástico e se senta pelo chão. Depois, deposita os restos mortais no cesto de coleta seletiva adequado. Tudo muito organizado.

Tudo muito organizado é como está a ocupação da Reitoria da USP, campus Butantã, zona Oeste paulistana.

O movimento começou dia 03 de maio e ontem, em Assembléia Geral que reuniu cerca de 2000 alunos, decidiu – mesmo após Isaías, o oficial de Justiça, às 18h02, ter entregado um pedido de reintegração de posse imediata – pela permanência da ocupação e pelo início de greve dos estudantes (os alunos, quando em greve, não assistem às aulas e permanecem em constante persuasão aos que não aderem; ou seja, piquete mesmo). Os funcionários entraram no barco na quarta-feira, dia 15. E os professores decidirão se apóiam a ocupação e entram em greve no dia 23.

Entre os 14 pontos da pauta de reivindicações está o posicionamento da reitora Suely Vilela contra os decretos que afetam a autonomia das universidades e a construção de 594 vagas para moradia (a reitoria ofereceu 196; e foi aí que as negociações pararam) – muitos alunos não completam seu curso por não terem condições de se manter fora de suas casas, em outras cidades.

Durante as falas da Assembléia, uma lembrava que aquele movimento é político e luta a favor da universidade pública, do ensino de qualidade e pela construção de justiça social.

Dentro do prédio, reuniões, conversas amistosas, debates acirrados e nenhum sinal de depredação ou mau uso do espaço público. Enquanto alguns preparavam o macarrão para o almoço, outros varriam o chão ou cuidavam da segurança de corredores que dão acesso a salas com acesso bloqueado a todos.


Lá de dentro também mantêm no ar o blog oficial e uma rádio web sobre a ocupação.
Assim, cerca de 100 pessoas permaneciam espalhadas pelo prédio, enquanto no Conselho Universitário, também ocupado, acontecia uma aula que reunia outros 200 alunos.


Em uma das paredes, dezenas de moções de apoio vindas de diversas entidades, partidos políticos e países. Além de cartazes com palavras de ordem, informativos e piadas (sim, piadas, ninguém é de ferro).

Há um otimismo geral de que o movimento permanecerá forte e pode levar a uma greve geral das universidades públicas de São Paulo. O que seria um grande desgaste para o governo do Estado.

A versão oficial, dada pela comissão de comunicação e que não pode ser contestada por mim, que passei a tarde de ontem dentro dos espaços ocupados, informa que não existe liderança e são constantemente abafadas as tentativas de partidarizar as ações.

A polícia pode chegar a qualquer momento e está autorizada pelo juiz Jayme Martins de Oliveira a usar a força, caso necessário. Mas não houve agitação especial por conta disso. Os alunos estão convictos dos seus objetivos e permanecerão até que sejam ouvidos.

Yuri, um dos citados no documento de reintegração de posse e que responderá a processo criminal (se o acharem. No documento não consta o seu sobrenome e o nome, talvez , seja falso. Só um garoto foi totalmente identificado, por ter dado seu nome no hospital do campus para fazer um curativo em ferimentos com caco de vidro, que conseguiu durante a entrada no prédio, no dia 3) diz que a ocupação é o “estopim de um movimento amplo” e que não há pretensão de ceder às ameaças da reitoria.

A luta na USP atinge toda a política educacional do país. Afinal, ela reivindica melhores condições de ensino, pesquisa e extensão, o que influencia toda cadeia produtiva do país.
Duzentas pessoas revezam-se dormindo há 14 dias em colchonetes e resistindo a pressões fortíssimas.

A causa, justa ou não, expõem toda a força do movimento estudantil. Sua capacidade de elaboração, organização e ação.

Depois de quatro horas de assembléia, às 23h, mais de 500 alunos ainda estavam sentados à frente da reitoria discutindo medidas e estatutos.

E quando os microfones e os discursos pararam, as caixas de som ainda tocavam uns sambinhas de Noel.

Os acomodados somos nós.

Gisele Brito escreve às quintas. Geralmente às quartas vai atrás de suas reportagens e por isso chega tarde em sua casa no Grajaú. O que sempre a leva a perder a aula de História na quinta de manhã. O que agora pode levá-la a uma DP. Hunf.