sábado, 26 de maio de 2007

Violência e Injustiça no Brasil

Eis, meus caros, o convidado da semana:

Antanas Mockus, ex-prefeito de Bogotá (na Colômbia), passou aqui por São Paulo, vindo de outro compromisso em Fortaleza. Vi-o numa apresentação memorável no auditório da Prefeitura da nossa Cidade.

Realmente ele se mostrou uma personalidade ímpar. Provoca reações imprevisíveis nas pessoas e cria oportunidades para a quebra de paradigmas. Depois da apresentação eu senti falta de um texto que resumisse sua fala. Fiquei dividido entre as tarefas de desfrutar daquilo que ouvia e anotar as idéias para não perdê-las. Decidi-me pela primeira. Os relatos do prefeito Antanas são intrigantes e capciosos. Ouvi-lo requer raciocínio rápido para entender a mecânica social que ele descreve com destreza.

Para lhes dar uma idéia de quem é ele:
- Antes de ser prefeito de Bogotá, Antanas foi reitor da Universidade Nacional da Colômbia. Para chamar a atenção dos universitários que faziam reivindicações, ele chegou a mostrar a bunda diante de todos.
- Já como prefeito, ele usou um colete à prova de balas com um buraco em forma de coração acima do peito. Tudo para se opor à ameaça das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) - guerrilha colombiana de esquerda - de assassinar os prefeitos colombianos que não renunciassem seus cargos em 2002.
- Fez de um pedaço de cano de PVC uma espécie de colar da cidadania. Para ele, PVC significaria Pacífica Vivência Cidadã. Convidou os bogotanos a fazer o mesmo.
- Vestiu-se uma vez de super-herói para dizer que as grandes metrópoles necessitam de verdadeiros heróis a fim de enfrentar problemas como a insegurança e a intolerância.

Na minha opinião, no caso da violência urbana, acredito que falta coragem para que nós, brasileiros, vejamos a realidade completa e integralmente. Poucas pessoas conseguem esse feito sem sentir a compulsão de abandonar o país. É preciso muita coragem para admitir que o Brasil foi e continua sendo palco de tanta violência e para aceitar nossa impotência perante esse fenômeno que já persiste há séculos e que produz em nosso âmago um amplo e diversificado repertório de precedentes.

A percepção é essencialmente produto da atenção do sujeito. Só percebemos algo a que nos dispomos prestar atenção. Já a interpretação é uma etapa diversa. Ela começa concomitantemente com a percepção e pode durar várias horas, até dias. A interpretação está diretamente relacionada com o repertório do sujeito. Só vemos aquilo que já temos dentro de nós.

A cada novo episódio de ônibus incendiado ou morte por bala perdida, como é inevitável voltar a face para o outro lado, desviando a atenção, recorremos à etapa de interpretação para trabalhar a negação coletiva do fato. Nesse sentido somos apoiados pela imprensa e pelo governo na tarefa hercúlea de iludir 180 milhões de pessoas.
Então agora já sabemos que, com ações isoladas, não podemos mudar essa realidade. Teremos que aprender a lidar com essa característica do nosso povo urbano ou buscar guarida na alienação.

O prefeito Antanas nos mostra, entretanto, que há um punhado de pequenos erros que só depende de nós mesmos reconhecê-los. Focalizemos nossa atenção nesses erros que estão ao nosso alcance. Reconheçamo-los e aprendamos com eles. Isso vai fazer uma grande diferença na nossa qualidade de vida. Ainda que o Brasil continue sendo um país violento por muito mais anos, alguma melhora com certeza virá.
Esse é o meu pensamento hoje. Mas,... eu posso estar errado. Pois somos todos humanos e falíveis.

Referências sobre Antanas:

aqui
aqui
aqui
e aqui

Robinson Rosario Pitelli foi abordado, há quase três anos, pelas paranóicas desse blog em uma palestra com o Mino Carta. Pedimos, na cara dura, seu telefone e e-mail e nunca ligamos, até cerca de um mês atrás, quando solicitamos sua participação neste espacinho virtual.