domingo, 8 de abril de 2007

O estereótipo paulistano

Prólogo:
Há algum tempo, estou com uma grande dificuldade de escrever sobre a Cidade. A princípio, achei que era bloqueio criativo, um desses hiatos que a gente finge que tem quando a cabeça está vazia ou cheia demais. Depois comecei a perceber que o problema era mais sério que a minha simples incapacidade argumentativa.

Eu não consigo escrever sobre a Cidade porque eu não a sinto mais.

Tentei me lembrar da São Paulo que agora me parece distante na memória. E então, a revelação: eu me tornei o estereótipo paulistano.

O estereótipo paulistano

O paulistano clichê é aquele que acorda às 5 da manhã todo dia. Até no domingo, porque esquece de desligar o alarme do celular e deixa pra tocar no último volume. E depois de enfrentar duas horas de trânsito, o paulistano clichê trabalha mais horas que o permitido pela legislação, come menos proteínas que o recomendado pelo conselho federal de nutricionistas e é gentil numa proporção inversa ao número de passageiros do ônibus que ele pegou.

O paulistano clichê mora na melhor cidade da América do Sul mas não sabe, porque em todo feriado sai da cidade, rumo à praia, ao campo ou à montanha.

O paulistano clichê come sempre no mesmo restaurante por quilo ou na mesma cadeia de fast food, mas lê a Vejinha na esperança de, em algumas férias, visitar um dos restaurantes “exóticos” que a revista indica, pra experimentar buchada de bode.

O paulistano clichê não olha pela janela do carro, do ônibus, do apartamento ou do escritório. Ele está normalmente ocupado demais, estressado demais, cansado demais.

Ele está sempre no mesmo lugar, e esse lugar não é a Cidade.

Por essas e outras, a imagem estereotipada do paulistano não permite que ele veja o que acontece em qualquer lugar que não sua própria cabeça carente de psiquiatra. E nessa, o estereótipo não gosta de São Paulo.

Eu ainda amo a Cidade, mas pela lembrança que tenho dela. Desde fins do ano passado que a vida anda mais longa que as horas do dia, e eu não tenho tido tempo pra apreciar todas as coisas boas que essa paulicéia tem. Nem as personagens pitorescas do transporte público, já que aproveito a 1 hora e meia diária de ônibus para dormir.

Dessa história, tenho duas morais:
1) Se você anda às brigas com São Paulo, pare, respire, e aprecie a paisagem. É cinza, assustadora e intimista. Mas dá um tempo pra ela. As coisas boas estão mais escondidas que o concreto dos prédios altos da gaiola.
2) Por causa da minha síndrome de paulistana clichê, eu não tinha um post. E continuo não tendo. Mas queria desejar boa Páscoa aos paulistanos que saíram da Cidade e estão pegando um puta trânsito pra voltar pra terrinha.


Aline escreve aos domingos, mesmo que não tenha nada a dizer.